O mito dos 10% do cérebro

Quanto do seu cérebro você usa? E da sua capacidade? E do seu potencial?

Fonte: Época
Quem já não ouviu essa frase: "Usamos apenas 10% do cérebro"? Em 1999, quando passei a trabalhar em divulgação científica, quis começar investigando o que o público conhecia e pensava sobre o cérebro. Numa pesquisa chamada "Você conhece seu cérebro?", perguntei a 2 mil cariocas, entre outras coisas, se eles concordavam com a célebre frase. A metade concordou. Fiz a mesma pergunta a 35 neurocientistas, e a frase foi prontamente recusada. A razão? Essa história de usar 10% do cérebro nada mais é do que um mito.

Vamos deixar claro logo do começo: não há qualquer razão científica para supor que usamos 10% do nosso cérebro. Nem 10% dos nossos neurônios. Nem 10% da nossa capacidade. Todas as evidências sugerem o contrário: usamos nosso cérebro inteiro. Os 10% ficam por conta da imaginação de quem conseguiu convencer quase metade da população do Rio de Janeiro a aceitar esse mito.

É verdade que, à primeira vista, a ideia de usar somente 10% do cérebro parece muito convidativa. Usando apenas 10% do cérebro, teríamos 90% de reserva, e se conseguíssemos aprender a usar esse "potencial" poderíamos ficar dez vezes mais inteligentes, memorizar dez vezes mais fatos, fazer contas dez vezes mais rápido... Só que não é assim.

O pior é que as consequências são graves. Quem acredita que 90% do seu cérebro são dispensáveis não tem por que evitar choques na cabeça, usando capacete na motocicleta ou cinto de segurança no carro. Quem não sabe que usa seu cérebro inteiro a todo momento ainda não faz ideia da maravilha que tem dentro da cabeça. E de quebra fica susceptível ao assédio de livros e cursos que se autodenominam "científicos" e pretendem ensinar "como usar os outros 90%". Espalhar o mito de que usamos 10% do cérebro ou da sua capacidade é um dos grandes desfavores que a mídia já fez ao homem e à ciência.

É difícil definir como surgiu esse mito, mas há uma possibilidade interessante. No começo do século XX, quando a ciência tentava identificar a localização das funções mentais no cérebro, um influente psicólogo americano, Karl Lashley (1890-1958), tinha uma opinião diferente. Lashley acreditava que o importante era haver uma massa suficiente de neurônios distribuída pelo cérebro, e não sua posição específica dentro dele. Um de seus principais argumentos era o de que a maior parte do córtex cerebral de ratos de laboratório - quase 90% - podia ser removida, e mesmo assim os animais ainda eram capazes de encontrar a saída de um labirinto.

O que Lashley esqueceu de considerar foi que os animais operados poderiam, por exemplo, usar os sentidos restantes para compensar um sentido lesado e ainda conseguir deixar o labirinto. Mesmo assim, os números eram impressionantes, e para alguém - não foi Lashley - concluir que bastavam 10% do cérebro para a memória funcionar era só um pulinho. E daí basta inverter a lógica para "deduzir" que apenas 10% do cérebro são usados.

Essa é apenas uma origem possível para o mito dos 10%. Em princípio, há várias maneiras de usar só 10% do cérebro: usando 10% da massa cerebral, 10% dos neurônios, ou 10% do potencial... Mas não importa: em qualquer um dos três casos, toda a ciência aponta para o contrário. Se são 10% da massa cerebral, 90% do que temos dentro da cabeça deveriam então ser dispensáveis. E, no entanto, lesões do cérebro humano, mesmo pequenas, podem ter consequências graves para o intelecto e o comportamento. Se são 10% dos neurônios, os outros 90% deveriam ser silenciosos, ou então redundantes, servindo só como "reservas". Mas é possível "escutar" as células nervosas em atividade, e em sua grande maioria elas estão ativas e respondem por algum aspecto do mundo ou do comportamento. E se são 10% da capacidade de desenvolvimento intelectual... será que alguém sabe o que seriam os 100%?

Uma dificuldade para aceitar que usamos 100% do cérebro pode ser a pergunta inevitável de quem estava convencido do contrário: se tudo é usado, como então é possível desenvolver nossas habilidades? A resposta está na mais maravilhosa e característica propriedade do sistema nervoso: a capacidade de fazer novas combinações entre seus elementos, e de mudar a eficiência das conexões - as sinapses - já existentes. Quando a eficiência aumenta, a conexão entre dois neurônios fica "fortalecida"; quando diminui, a conexão fica "enfraquecida". Além do mais, nenhuma conexão é fixa; uma conexão enfraquecida demais pode ser eliminada, e uma nova pode ser feita em outro lugar, com outro neurônio. Fortalecer essas novas conexões, estabilizando-as, é uma maneira de criar novas associações. Os neurocientistas hoje estão convencidos de que é essa a base do aprendizado. Como sempre se pode tirar uma conexão daqui e criar outra ali, será sempre possível fazer mais uma combinação, mais uma associação entre neurônios, e aprender mais alguma coisa.

Talvez nem sempre fique tudo na lembrança; talvez seja mesmo necessário esquecer algumas coisas para poder lembrar de outras. Não importa. Aprender, a mais nobre função do cérebro, não funciona a 10%, nem a 100%, nem a 1% da sua capacidade. Não há limite. Simplesmente funciona.


Retirado de: HOUZEL, Suzana Herculano-. O cérebro nosso de cada dia: descobertas da neurociência sobre a vida cotidiana. Rio de Janeiro: Vieira & Lent, 2002.

9 comentários:

  1. Interessante, no entanto, muitos confundem a frase de usar 10% do cérebro com "usar 10% da capacidade do cérebro".
    Assim como também não usamos 100% a "capacidade" física do nosso corpo, por questões biológicas.

    ResponderExcluir
  2. @Lord_Kure Mesmo assim. Como ela mesma diz, "não há qualquer razão científica para supor que usamos 10% do nosso cérebro. Nem 10% dos nossos neurônios. Nem 10% da nossa capacidade. Todas as evidências sugerem o contrário: usamos nosso cérebro inteiro."

    ResponderExcluir
  3. É verdade agente usa nosso cerebro inteiro mais depende de como ou qui fazemos entende muitas pessoas são preguisosas e naum tentam fazer outrro tipo de atividades so do trabalho pra casa e não leem um livro ou praticam um exercicio como qui elas vão querer qui o cérebro funcione bem?_)_ aqui pra eles

    ResponderExcluir
  4. Por exemplo você que escreve tudo errado. "Agente" e "preguisosas".

    ResponderExcluir
  5. Você que tirou o cara anterior ao seu comentário,use seu cérebro pra entender o que ele quis dizer, e guarde sua crítica pra você...

    ResponderExcluir
  6. bom a ciencia nunca vai admitir tal avirmação porque,
    isso iria contra a logica, pois elis ainda não tem provas suficiente sobre isso,
    na verdade usamos 100% do nosso cerebro e usufluimos de apenas 10% de sua capacidade talvez menos.
    isso voçes verão com a evolução não apenas fisica mas tambem mental.

    ResponderExcluir
  7. Bem que usamos todas as parte do cérebro entendo, oque quero saber é sobre o potencial. como o texto diz pode ser criadas mais associações, a pergunta é quantas mais? tem alguma forma de aumentar a capacidade do cérebro? como a velocidade na qual a informação vem e vai de um ponto a outro? teria como fazer uma ligação mais forte do as atuais, ate quando se pode fortalecer essas associações e como fazer isso. Talvez o que tenha acontecido de erado foram as perguntas não sei se as minhas são as corretas mais se sai melhor que o obvio que é perguntar se usamos apenas 10% da cuca, e ai alguém topa responder?

    ResponderExcluir
  8. Bem, como pode-se então explicar o fato de ter existido um Albert Einstein da vida? Pode ser genético? Seleção natural da vida, em escolher um cérebro para ser genial? Conhecimento todos os indivíduos obtém durante seus dias de vida, mas, como um indivíduo de oitenta anos por exemplo, pode se lembrar de um simples fato de sua vida acontecido quando ele tinha vinte anos de idade? Boa memória simplesmente? um cérebro bem treinado? ou o fato de que essa pessoa conseguiu explorar o restante dessa porcentagem do seu cérebro,como num simples acesso em um banco de dados? Acredito sim que há dificuldades de se acessar muito ainda da capacidade do seu cérebro. Se em sua vida colegial você aprende a utilizar a fórmula do movimento uniforme variado ,por exemplo, escalas de medida, parâmetros para cálculos exatos etc...você ao andar na rua ,ao observar o deslocamento de um veículo tendo um outro a uma certa distância à sua frente como referência, seria capaz de com base em cálculos afirmar que este veículo colidiria com o outro à sua frente? ou em um determinado instante de dúvida rapidamente saber o que fazer, simplesmente acessando esta parte do seu cérebro. Acredito que todo e qualquer cérebro tem sim capacidade de aumentar e muito sua capacidade cognitiva com algum tipo de treinamento ou qualquer outro método de estímulo específico.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. a questão não é se a capacidade do cérebro é expansível. o mito está em torno da quantidade, 10%. por que não 20, 30, 25%? não é uma quantidade mensurável, como a capacidade de um HD, ou o poder de processamento de um processador. na minha opinião, é tudo uma questão de exercício, treino. se você não exercitar, vai perdendo a capacidade ao longo dos anos. e é claro que há exceções, como algum tipo de predisposição à uma quantidade/capacidade/qualidade maior de sinapses, que leve a uma maior facilidade de aprendizado, de memória e de busca das informações, por exemplo.

      espero ter esclarecido sua dúvida ;)

      Excluir

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...