Risco de vida ou risco de morte?

Um educado leitor escreve para estranhar que esta página utilize a expressão risco de vida, alegando que um professor de renome já corrigiu este equívoco de uma vez por todas: "É risco de morte, pois só pode correr risco de vida um morto que está em condições de ressuscitar". Sinto dizer-te, meu polido leitor, mas não é bem assim que funciona. A experiência me ensinou a suspeitar, de antemão, de tais "descobertas" adventícias, feitas por essas autoridades que aparecem para me anunciar, com aquele olhar esgazeado do homem que viu a bomba, que eu estive cego e surdo todo esse tempo. Talvez não saibas, mas o Brasil assiste agora a uma nova safra desses Antônios Conselheiros da gramática: volta e meia, aparece um maluco disposto a reinventar a roda e a encontrar "erros" no Português que já era falado pela avó da minha bisavó e pelos demais antepassados - incultos, cultos ou cultíssimos. O que esses fanáticos não sabem (até porque, em sua grande maioria, pouco estudo têm de Lingüística e de Gramática) é que, mesmo que a forma que eles defendem seja aceitável, a outra, que eles condenam, já existia muito antes do dia em que eles próprios vieram a este mundo para nos incomodar.

Os falantes do Português sempre interpretaram esta expressão como a forma elíptica de "risco de perder a vida". Ao longo dos séculos, todos os que a empregaram e todos os que a ouviram sabiam exatamente do que se tratava: pôr a vida em risco, arriscar a vida. Assim aparece na Corte na Aldeia, de Francisco Rodrigues Lobo; nas Décadas, de João de Barros; em Machado ("Salvar uma criança com risco da própria vida..." - Quincas Borba); em Joaquim Nabuco; em Alencar; em Coelho Neto; em Camilo Castelo Branco e Eça de Queirós; na Bíblia, traduzida por João Ferreira de Almeida no séc. 17 ("Ainda que cometesse mentira a risco da minha vida, nem por isso coisa nenhuma se esconderia ao rei" - II Samuel 18:13); e assim por diante. Além disso, nossas leis falam em "gratificação por risco de vida", o Código de Ética Médico fala de "iminente risco de vida" e o dicionário do Houaiss, no verbete "risco", exemplifica com risco de vida. E agora, meu caro leitor? Achas mesmo que o teu renomado professor, se pudesse entrar em contato com o espírito de Machado ou de Eça, teria a coragem de dizer-lhes nas barbas que eles tinham errado durante toda a sua vida literária - e que ele estava só esperando a oportunidade para dizer o mesmo para Camilo Castelo Branco, Joaquim Nabuco e outros escritores que não tinham tido a sorte de estudar na mesma gramática em que ele estudou?

Nota, porém, que a defesa que faço do risco de vida não implica a condenação do risco de morte, que também tem seus adeptos - entre eles, o padre Manuel Bernardes e o mesmo Camilo Castelo Branco, que, nesta questão, acendia uma vela ao santo e outra ao diabo. Na maioria das vezes, seu emprego parece obedecer a um critério sutilmente diferente, pois esta forma vem freqüentemente adjetivada (risco de morte súbita, de morte precoce, de morte indigna) ou sugere uma estrutura verbal subjacente (risco de morte por afogamento, de morte por parada respiratória, de morte no 1º ano de vida, etc.) - ficando evidente a impossibilidade de optar por risco de vida nessas duas situações. Como se vê, somos obrigados a reconhecer que também é moeda boa, de livre curso no país, a única a ser usada em determinadas construções - mas não é um substituto obrigatório do consagradíssimo risco de vida. Aliás, a disputa entre as duas formas não é privilégio nosso, pois ocorre também no Inglês (risk of life, risk of death), no Espanhol (riesgo de vida, riesgo de muerte) e no Francês (risque de vie, risque de mort).

O equívoco da renomada (famigerada?) autoridade que mencionas, prezado leitor, foi acreditar ingenuamente que a nossa língua existe para expressar nosso pensamento, devendo, portanto, obedecer aos critérios da lógica - teoria que andou muito em voga lá pelo final do séc. 18 e que foi abandonada junto com a tabaqueira de rapé e o chapéu de três bicos. Por este raciocínio, se enterro um prego na madeira e enfio a linha na agulha, não poderia enterrar o chapéu na cabeça e enfiar o sapato no pé (e sim a cabeça no chapéu e o pé no sapato...); um líquido ótimo para baratas deveria deixá-las alegres e robustas, e não matá-las. A língua não pode estar submetida à lógica porque é incomensuravelmente maior do que ela, já que lhe cabe também exprimir as emoções, as fantasias, as incertezas e as ambigüidades que recheiam o animal humano. O Português atual, portanto, é o produto dessa riquíssima mistura, sedimentada ao longo de séculos de uso e aprovada por esse plebiscito gigantesco de novecentos anos, que deve ser ouvido com respeito e não pode ser alterado por deduções arrogantes e superficiais.

Retirado de: http://www.adur-rj.org.br/5com/pop-up/risco_vida_risco_morte.htm

A origem da filosofia

A palavra filosofia é grega. É composta por duas outras: philo e shofia. Philo deriva-se de philia, que significa amizade, amor fraterno, respeito entre os iguais. Sophia quer dizer sabedoria e dela vera a palavra sophos, sábio.

Filosofia significa, portanto, amizade pela sabedoria, amor e respeito pelo saber. Filósofo: o que ama a sabedoria, tem amizade pelo saber, deseja saber.
Assim, filosofia indica um estado de espírito, o da pessoa que ama, isto é, deseja o conhecimento, o estima, o procura e o respeita.

Atribui-se ao filósofo grego Pitágoras de Samos (que viveu no século V antes de Cristo) a invenção da palavra filosofia. Pitágoras teria afirmado que a sabedoria plena e completa pertence aos deuses, mas que os homens podem desejá-la ou amá-la, tomando-se filósofos.

A filosofia, entendida como aspiração ao conhecimento racional, lógico e sistemático da realidade natural e humana, da origem e das causas do mundo e de suas transformações, da origem e das causas das ações humanas e do próprio pensamento, é um fato tipicamente grego.

Evidentemente, isso não quer dizer, de modo algum, que outros povos, tão antigos quanto os gregos, como os chineses, os hindus, os japoneses, os árabes, os persas, os hebreus, os africanos ou os índios da América, não possuam sabedoria, pois possuíam e possuem. Também não quer dizer que todos esses povos não tivessem desenvolvido o pensamento e formas de conhecimento da Natureza e dos seres humanos, pois desenvolveram e desenvolvem.

Quando se diz que a filosofia é um fato grego, o que se quer dizer é que ela possui certas características, apresenta certas formas de pensar e de exprimir os pensamentos, estabelece certas concepções sobre o que sejam a realidade, o pensamento, a ação, as técnicas, que são completamente diferentes das características desenvolvidas por outros povos e outras culturas.

Através da filosofia, os gregos instituíram para o Ocidente europeu as bases e os princípios fundamentais do que chamamos razão, racionalidade, ciência, ética, política, técnica, arte.

Aliás, basta observarmos que palavras como lógica, técnica, ética, política, monarquia, anarquia, democracia, física, diálogo, biologia, cronologia, gênese, genealogia, cirurgia, ortopedia, pedagogia, farmácia, entre muitas outras, são palavras gregas, para percebermos a influência decisiva e predominante da filosofia grega sobre a formação do pensamento e das instituições das sociedades européias ocidentais.

Retirado de: ARRUDA, José Jobson de A. e PILETTI, Nelson. Toda a história. São Paulo, Ática, 2002.

Buracos negros

O termo universo é a chave que remete nossa imaginação a uma imensidão sem fim, em que pontos e regiões brilhantes se sobressaem, contrastando com um fundo negro ilimitado que alguns chamam de infinito.

Os pontos brilhantes que adornam o céu escuro são, na maioria, estrelas que seguem um rito natural, semelhante ao dos seres vivos, de nascimento, vida e morte.

Nuvens de gases e poeira cósmica, constituídas principalmente por hidrogênio, começam a se aglomerar movidas por forças de atração gravitacional. É nesse momento que tem início o surgimento de uma nova estrela, cujo núcleo vai adquirindo temperaturas elevadíssimas, da ordem de milhões de graus Celsius. Essa elevação da temperatura desencadeia o processo de fusão nuclear que transforma o hidrogênio em hélio. Dessa forma, quantidades fantásticas de energia radiante são lançadas no espaço, propagando-se com a velocidade da luz (c = 300 000 km/s).

A Terra recebe do Sol, nossa estrela mais próxima, uma quantidade de energia equivalente, em média, a 2 calorias por segundo por centímetro quadrado de área perpendicular aos raios solares. Só para se ter uma idéia da energia liberada pelo Sol, seriam necessárias todas as reservas de petróleo, gás natural e carvão da Terra para fornecer um milionésimo do que o Sol produz em 1 segundo.

Essa energia radiante, entretanto, é emanada pelas estrelas durante um intervalo de tempo limitado. Quando o combustível nuclear — o hidrogênio — se esgota, elas passam a se compactar, desabando sobre si mesmas pela ação de forças de origem gravitacional e concentrando suas enormes massas em volumes extremamente pequenos se comparados aos volumes originais.

Dependendo de sua massa, uma estrela poderá transformar-se num buraco negro — um corpo hipercompactado, que tem sua gigantesca quantidade de matéria aglomerada num volume muito reduzido.

O Sol tem uma massa muito pequena para se transformar num buraco negro. Sua agonia como estrela, prevista para daqui a 5 bilhões de anos, deverá conduzi-lo à condição de anã branca, que é outro tipo de cadáver estelar. Os buracos negros mais comuns têm massa equivalente à de dez sóis.

Recordemos que a intensidade da aceleração da gravidade na superfície de um astro (g), desprezada sua rotação, é dada em função de sua massa (M) e de seu raio (R) por:



g = G * M/R


onde G é a Constante da Gravitação.

Como no caso dos buracos negros M é muito grande e R é muito pequeno, resulta g muito grande, o que produz em torno desses corpos campos gravitacionais extremamente intensos, que influem significativamente em todas as massas das proximidades, inclusive na luz, que é sensivelmente desviada pela sua atração.

Quando lançamos uma pedrinha verticalmente para cima, a partir da superfície de um astro, ela atinge determinada altura máxima e, depois de certo intervalo de tempo, retorna praticamente ao ponto de partida. Se repetirmos o lançamento imprimindo à pedrinha uma velocidade inicial maior, ela se elevará a uma altura maior, mas ainda voltará ao solo, atraída gravitacionalmente pelo astro. Se lançarmos a pedrinha sucessivamente com velocidades cada vez maiores, chegaremos a situações em que ela "escapará da gravidade do astro", não mais retornando à sua superfície.

A velocidade de escape na Lua, por exemplo, é de 1,8 km/s; na Terra, de 11,2 km/s e no Sol, de 620 km/s. Nos buracos negros, a velocidade de escape supera a barreira dos 300 000 km/s; por isso, nem mesmo a luz consegue escapar da sua atração. É por esse motivo que esses corpos celestes são invisíveis, tendo sua presença registrada apenas pela expressiva influência gravitacional manifestada nos arredores.

Se o Sol tivesse volume igual ao da Terra, a velocidade de escape desse astro fictício seria de 6 500 km/s. Para que a Terra se transformasse num buraco negro, sua massa deveria ser compactada até volumes menores que o de uma bola de gude.

Apesar de ser um tema muito discutido em nossos dias, os buracos negros já vêm sendo estudados desde o século XVIII: o astrônomo inglês John Michell (1724-1793) analisou a possibilidade da existência desses corpos, o mesmo ocorrendo com o matemático francês Pierre Simon de Laplace (1749-1827).

Atualmente, todas as teorias astronômicas utilizam essa concepção, dotando o Universo desses pólos invisíveis, verdadeiros sorvedouros de matéria, que desafiam a imaginação e levam o homem a se questionar em busca de explicações.

Conhecendo o inimigo

Fonte: Anjos e guerreiros
O que é câncer — Cientificamente, o câncer atende pelo nome de neoplasia, palavra originada do grego neo = novo, com o latino plasma = forma, que indica uma formação recente e anormal de tecido que não desempenha qualquer função no organismo. São células do próprio organismo que, por algum motivo, começam a se multiplicar desordenadamente. Nem toda neoplasia, no entanto, é cancerosa. O câncer enquadra-se na categoria das neoplasias — ou tumores — malignas. Enquanto os tumores benignos formam massas nitidamente demarcadas, os malignos caracterizam-se por invadir e danificar tecidos normais, localmente ou em partes distantes do corpo. Isso é possível devido a um fenômeno chamado de metástase: as células malignas entram no sistema linfático e na corrente sangüínea e são transportadas para outras partes do organismo. Os especialistas em câncer, chamados de oncologistas — do grego onkos, que significa volume ou massa —, já conseguiram detectar aproximadamente 150 tipos de tumores malignos, dependendo do local onde o tumor se desenvolve.

Qual é a causa — O câncer surge devido a mutações genéticas que provocam uma multiplicação descontrolada e um comportamento agressivo das células. Nem sempre é fácil descobrir o que provoca essa mutação. Há fatores internos, como hereditariedade ou o próprio processo de envelhecimento, e fatores externos, como a ação da radiação, tanto dos raios X quanto dos ultravioleta, provenientes do sol, além do uso de substâncias químicas cancerígenas. Dentre os fatores externos, o mais importante é certamente o fumo. O tabaco contém pelo menos 43 substâncias comprovadamente cancerígenas. Ele é responsável direto por 30% de todo o câncer existente no mundo, especialmente os que atingem o pulmão, boca, laringe, esôfago, rins, fígado, pâncreas e bexiga. Substâncias cancerígenas também são encontradas nos resíduos industriais, nos pesticidas e conservantes de alimentos industrializados. Outro fator externo relacionado ao aparecimento do câncer é o ataque de alguns tipos de vírus, como o retrovírus HTLV l e 2, que provocam alguns tipos de leucemias e linfomas, o papiloma vírus, responsável pelo câncer de colo do útero e o vírus da hepatite B, que pode causar câncer de fígado.

Retirado de: LOPES, Sônia. Bio – Volume único. Editora Saraiva.

Encalhei - por Ulisses Tavares

Meu navio corpo encalhou num banco de areia quando comecei a singrar velozmente as léguas dos vícios. E agora o vigor da juventude é uma ilha perdida a mil milhas daqui.

Meu navio espírito encalhou em maré baixa quando minha fé foi saqueada pelos piratas do templo é dinheiro. E agora rezo às vitrines dos shoppings, esses altares iluminados e profanamente sagrados para o homem contemporâneo.

Meu navio coração encalhou nos recifes para onde as sereias me atraíram. E agora confundo seus cantos dantes melodiosos com estridentes risadas de escárnio.

Meu navio ideologia encalhou quando votei, errei e meus eleitos partiram em seus iates. E agora estou jogado aos tubarões que comem peixinhos mirrados e plebeus como eu.

Meu navio consumidor encalhou nos ouvidos surdos do tele atendimento, que só tem tempo para vender. E agora corro atrás da furreca da garantia do liquidificador. O que era para facilitar o meu dia-a-dia serve apenas para desperdiçar os meus dias.

Meu navio cidadão encalhou no chiqueiro imenso da economia porcalhona. E agora procuro, sem achar, uma ONG não corrompida. Havia uma, disseram, mas afundou por falta de financiamento.

Meu navio desejo encalhou no furacão dos corpos nus, reais e virtuais, que me envolvem. Não tendo igualmente corpo tentador para trocar me restaria o consolo de comprar unzinho, mas agora estou pelado com a mão no bolso vazio.

Meu navio contribuinte encalhou e a guarda-costeira só açode mediante propina. E agora espero um fiscal mais compreensivo e mais baratinho.

Meu navio transcendental encalhou na porca miséria da matéria. E agora medito sobre as contas a pagar no final do mês, no final dos tempos dos eternos carnes.

Já me imaginei navio senhor dos sete mares. Encalhei na realidade e me vi canoa furada. E a água continua subindo.


Ulisses Tavares até sabe que o navio de nossa vida nem sempre chega ao porto pretendido. Mas não se conforma. Coisas de poeta.
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