O Pensador, de Auguste Rodin. Fonte: Musée Rodin |
Com estes primeiros passos vieram, ao longo dos milênios, muitos sistemas complexos de pensamento, muitas dúvidas, muitas perguntas, novos problemas, reformulação dos velhos problemas ainda não respondidos... Quem sou? De onde vim? Para onde vou? O que é a morte? O que é a vida? O que é certo e o que é errado? O que é a verdade? Grandes problemas que parecem nunca ter uma solução definitiva, e assim caminha a humanidade na eterna busca da sabedoria. E tudo isto começou lá atrás, a 2500 anos. Quer saber como? Entremos então na máquina do tempo da imaginação e desembarquemos na Grécia Antiga, reino de grandes histórias míticas, onde grandes poetas como Homero e Hesíodo, que nas suas tragédias e comédias, cantavam odes as deusas e deuses.
Nesta época, dominavam as narrativas mitológicas como explicação para as mais diversas situações da vida. Entre meio a lutas, alianças e relações sexuais, os deuses governavam o mundo e o destino humano no imaginário mitológico. Poseidon controlava as forças do mar, Afrodite as do amor, Apolo era o deus da beleza, Deméter a deusa da fertilidade. Zeus, que quando se irava lançava raios e trovões do Olímpo para a terra, relacionou-se com uma mulher mortal, Alcmena, dando origem a Heracles (Hércules na mitologia romana), um semi-deus cuja força descomunal utilizava para defender os mortais. Hércules, portanto, era uma espécie de “super-homem” dos gregos antigos. E assim eram muitos outros deuses e deusas, que nas suas narrativas explicavam alegoricamente a origem das mais diversas situações da vida.
No entanto, gradualmente este processo foi se racionalizando, embora o mito fosse um importante processo de organização social que ainda hoje se mostra presente em nossas vidas (a concepção religiosa de Jesus, Buda etc., são exemplos disto), e desenvolveu-se o pensamento filosófico, que compreendendo as limitações e contradições do pensamento mítico (CHAUÍ, p. 31, 1995) não se fixava em crenças religiosas, mitos imaginários, deuses e deusas, mas sim numa racionalização dos fatos que compunham a vida no seu aspecto mais científico. Assim, enquanto o mito falava de Urano, Ponto e Gaia, a filosofia falava de céu, mar e terra. Enquanto o mito falava de disputas de deuses, a filosofia falava das produções naturais através dos elementos e causas naturais e impessoais (CHAUÍ, p.31, 1995). Enquanto o mito não se importava com as contradições nas narrativas fabulosas, a filosofia não admitia contradições e coisas incompreensíveis, buscando explicações coerentes, lógicas e racionais.
Neste ínterim surgiram os primeiros filósofos, no século 6 a.C, chamados de pré-socráticos, e que tinham uma preocupação primeira com a physis (a natureza), baseados na cosmologia, física e matemática. Sua preocupação inicial era com uma explicação racional da origem do mundo e para isto utilizaram-se de abordagens reducionistas e monistas, ou seja, tudo se reduzia a algum elemento básico para o mundo.
O primeiro grande nome desta mudança, considerado o pai da filosofa, foi Tales de Mileto, por volta de 627 a.C. (BRAZIL, p.30, 1990). Tales acreditava que o elemento fundamental, origem de tudo e para onde tudo voltaria após a morte, era a água. Sim... tudo era composto de água e voltaria a ela posteriormente. Embora isto pareça muito estranho para nós atualmente, o interessante é observar como Tales chegou a esta conclusão. Utilizando-se da lógica e da razão, Tales constatou que todas as coisas se nutrem da água e sem ela secam e morrem, que tudo dependia da água para viver e, portanto, este deveria ser o elemento fundante. É interessante observar o fundo lógico desta constatação. Ainda hoje, quando os astrônomos buscam vida em outras planetas, a primeira coisa que procuram constatar é se há água nestes lugares, pois se houver água, provavelmente haverá vida.
Posteriormente surgiram outras teorias como a de Anaxímenes de Mileto que dizia que o princípio fundante era o ar, Heráclito onde o princípio era o fogo, Empédocles que dizia que havia quatro elementos fundantes, a terra, a água, o ar e o fogo, enfim, todos estes filósofos tidos como pré-socráticos tinha como preocupação a natureza e o seu fundamento, utilizando-se para isto de uma abordagem diferente da mitológica, ou seja, utilizando-se da razão perante fatos da natureza, e não sobre fatos sobrenaturais.
Assim, surgiram os primeiros filósofos, aqueles que ousaram dar os primeiros passos para uma compreensão lógica e racional do mundo, evitando apoiar-se em explicações sobrenaturais. Graças a estes primeiros filósofos, 2500 anos de filosofia se estenderam e as perguntas iniciais sobre a natureza (physis) desenvolveram-se para questionamentos de origem mais humana, que perpassaram as teorias de Sócrates, Platão, Aristóteles e alcançam hoje os filósofos modernos.
Guilherme R. Fauque
Adaptado de: http://philosophia-aton.blogspot.com/2009/09/na-sala-de-aula.htm
Acesso em: 03 de março de 2010, às 16h25min
Bibliografia citada pelo autor:
BRAZIL, Stella Telles Vital. A Divina Filosofia Grega. Curitiba: Editora AMORC, 1990.
CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Editora Ática, 1995.
FEARN, Nicholas. Aprendendo a Filosofar em 25 lições: Do poço de Tales à desconstrução de Derrida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004.